quarta-feira, 15 de julho de 2009

Estória Memória da Gata Filória

24/02/1975 – Da série “Ternura”

“Parábola dos Três Gatinhos”

Estória memória da gata Filória.

Estória que minha mãe contava em nosso tempo de infância.

Um dia a gata Filória deu à luz três lindos gatinhos.

Um era branquinho, o segundo era amarelinho e o terceiro nasceu pintadinho.

A gata Filória era toda felicidade. Andava miando de satisfação.

Quando os gatinhos abriram os olhos e começaram a andar, a gata Filória passeava toda sua elegância pela redondeza. E todos comentavam a vaidade da gata e a graça saltitante dos gatinhos.

Os gatinhos foram crescendo e se tornaram gatos fortes, ágeis e corajosos. Todos com idéias de progresso matutando na cabeça.

Num dia de sol, enquanto a brisa da tarde brincava nas folhas das árvores, o gatinho branco, que já era um senhor gato, o Branco, disse a sua mãe:

- Mãe, eu já estou grande e posso ganhar a vida sozinho. Andei trocando idéias com amigos e resolvi ir à cidade e trabalhar de alfaiate. Talvez ainda venha a ser um famoso costureiro.

Disse isso e partiu, enquanto a mãe, de olhos molhados, viu um vulto branco desaparecer na curva do caminho.

Dias depois chegou o gatinho amarelo, que já era um senhor gato, o Amarelo. Aproximou-se da mãe, deu-lhe um beijo e disse:

- Mãe, preciso construir minha vida. Dias atrás fui à cidade e percebi que lá a vida é melhor. Resolvi ser sapateiro. Quando tiver aprendido bem o meu ofício lhe mandarei um sapato de presente, de camurça, bem fofinho.

Disse isso e partiu também, sem esquecer de dar outro beijo em Dona Filória. A mãe deu-lhe um prolongado abraço e foi esconder-se no quarto pra não ver o filho partir.

Numa noite de verão, enquanto conversavam, deitados ao luar, o Pintadinho, que também já se transformara em gato robusto e valente, criou coragem e confessou seu desejo a mãe Filória:

Mãe, não posso mais viver às suas custas. Andei pensando muito em meu futuro, sem me esquecer da senhora, e refletindo muito sobre a família que pretendo constituir. Quero, acima de tudo, que a felicidade reine em nosso lar. Analisando a situação do mundo, resolvi a procurar um sítio fértil e lá ganhar a vida e construir o futuro no cultivo da terra. Se um dia a senhora precisar de mim, apareça em minha casa que será sua também. Amanhã irei partir.

Durante a noite a gata Filória teve um sono perturbado. Imaginava o que poderia ter ocorrido com o Branquinho e com o Amarelinho. Teve pesadelos em que viu o corpo do Branquinho na bocarra de um canzarrão, ou o Amarelinho gritando aflito, ao decepar dois dedos com uma lâmina de sapateiro. Mas o pior dos pesadelos foi quando lhe apareceu a casa do Pintadinho cercada por bandoleiros armados até os dentes.

Ao clarear do dia Pintadinho a chamou. Ela acompanhou o filho até a curva do caminho e lhe pediu que lhe enviasse notícias, logo que se estabelecesse. Um demorado abraço foi a última despedida.

***

Passaram-se os anos. Gata Filória já é uma velhinha desdentada e unhas enfraquecidas. Não pode mais caçar para seu sustento. E vê que em breve não poderá sustentar as longas caminhadas à procura de alimentos. Então, pensamentos lhe martelam o cérebro: “Que terá sido de meus filhos? O Branquinho apenas mandou-me uma carta, quando nasceu seu primeiro filho. O Amarelinho, mandou-me um convite de casamento e os sapatos de camurça ficaram apenas de promessa. Do pintadinho às vezes recebia alguns cereais, quando passava por lá algum amigo. Irei visitá-los e ver se um deles me recebe em sua casa”

Mas a gata Filória, ao chegar na curva do caminho, baixa o olhos e volta ao velho abrigo.

Para menores de 10 anos e maiores de 60, termina assim:

E a gata Filória se pôs a caminho:

Andou, andou. E depois de muito caminhar chegou à casa de Branquinho.

- Meu filho – disse ela – estou velha e fraca e já não posso ganhar meu sustento. Nem mais posso caçar algum ratinho. Você, Branquinho, pode me receber em sua casa?

- Infelizmente, mamãe, a situação anda muito ruim. Tenho poucas encomendas. O único trabalho que tenho encomendado é um terno para meu irmão, o Pintadinho e algumas calças para seus filhos. Lamento muito, mamãe, mas que vou fazer?

Triste, a velha gata Filória se pôs a caminho.

Chegando à casa do Amarelinho, fez o mesmo pedido e recebeu resposta semelhante:

- Seria meu maior prazer poder abrigá-la em minha casa, mamãe – disse o Amarelinho – mas tenho família grande e estou apenas com algumas encomendas de meu irmão, o Pintadinho. Estou fazendo botas pra ele e sua família.

Mais uma vez a velha Filória pôs os pés na estrada.

O sol já ia se escondendo por trás das árvores, quando a gata Filória chegou à casa do Pintadinho. Foi recebida com abraços e festa. Pintadinho foi lhe apresentando a mulher, os filhos e filhas, gabando as qualidades de cada um. A velha Filória sorria entre os netinhos. Depois o Pintadinho mostrou-lhe as criações, o pomar, as plantações. E não se cansava de contar a estória de cada árvore, de cada animal, dos roçados e lavrados.

Finalmente a velha Filória teve oportunidade de falar e lhe disse:

- Mamãe, a senhora está em sua casa e não precisa explicar nada, O que é meu é seu. Estou feliz em saber que a senhora se lembrou de mim. Grande seria a minha tristeza se a visse partir de novo.

Emocionada, a velha gata Filória abraçou o filho e chorou em seus braços.

Dr. Pedro A. Grisa

Um comentário:

  1. Ola Sr. Pedro Grisa,
    Eu li sua segunda edicao de O Jogo e a Estrutura das Personalidades e desde entao os ensinamentos deste livro nunca me abandonaram. Moro nos E.U. ha 8 anos e mais do que nunca tenho falado deste livro para todos que conhecem, muitos querem le-lo. Meu sonho e' traduzir seu livro e gostaria de saber o que o Sr pensa a este respeito.
    Com carinho, Cristine
    cristinejh@hotmail.com

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